© Francesca Woodman
A fotógrafa americana Francesca Woodman (Denver, 1958-1981), deixou-nos um legado de cerca de 800 fotografias em que o objecto principal do seu trabalho era o próprio corpo, apresentado por vezes com uma visão tão comovente que parece impossível ter sido criada por alguém tão novo.
Começou a fotografar com apenas 13 anos, enquanto estudava na Abbot Academy, uma das poucas com cursos de arte. Uma das suas professoras, a fotógrafa Wendt Snyder McNeill incentiva-a a prosseguir os seus estudos na Rhode Island School of Design (RISD, Providence/EUA).
Entre 1977 e 197878 estuda em Roma (itália) na sede européia do RISD com a amiga Sloan Rankin, e realiza aí a sua primeira exposição individual. No outono de 1978 volta a Providence, onde conclui os estudos na RISD, obtendo o título de BFA em Fotografia e de seguida vai viver para Nova Iorque.
No início de Janeiro de 1981 publica um livro que era claramente um pedido de ajuda: "Some Disordered Interior Geometries". Uma semana depois, a 19 de Janeiro atira-se da janela do seu apartamento, mergulhando finalmente para a morte, pela qual sempre se sentira atraída. Tinha apenas 23 anos.
Escrevendo a um colega, dizia Woodman “A minha vida neste momento é muito antiga, como sedimento da chávena de café e prefiro morrer jovem deixando várias realizações…em vez de desordenadamente apagar todas essas coisas delicadas…”
Miguel Cardoso dedicou-lhe um poema:
FRANCESCA WOODMAN
Uma rapariga
que roda
a cabeça
na sombra
e os pés
no bordo
tremendo
da madeira
desfoca
o centro do amor.
Uma rapariga
que enrola
as tripas
na luz
que afaga
as paredes
e roça
os vestidos
nas costuras
das casas
cristaliza
o poroso poder
do cimento
Uma rapariga
que ventoinha
nua
mostra
os dentes
e traça
quadrados
de arame
no ar
enrodilha
os corpos
no medo.
Ah como a carne
saltita
macilenta
nas fotografias
e como é bom saltar
à corda
sobre sombras.
O tempo sustém
roupas e cabelos
com pinças delicadas.
Não é fácil fingir que se paira,
que não se vai morrer.
Pode-se acreditar nos lugares
onde uma rapariga adia o corpo mortal,
nos lugares onde a pele chupa a luz
e se afunda no umbigo
dos lugares.
Pode-se acreditar no reverso
dos corpos, no negativo aguçado
do lugar que nos foi dado.